terça-feira, 10 de setembro de 2013

A nova carta de Pero Vaz de Caminha



A nova carta de Pero Vaz de Caminha
Autor: Paulo D'Angelo

      Olá, meu amado Rei, aqui quem fala é o Pero Vaz.   Está a me ouvir bem?
      Peguei emprestado o celular de um nativo aqui da nova  terra. Tudo bem, Capitão Pedro está a mandar um  abraço. Chegamos na terça, 21 de abril, mas   deixei para ligar no domingo porque a ligação  é mais barata.  É, aqui tem dessas coisas. Os  nativos ficaram espantados com a nossa chegada por mar, não achavam que éramos deuses, Majestade. Acharam  que éramos loucos de pisar em um mar tão sujo.
      A ligação está boa?  Pois é, essa terra  é engraçada. Tem telefonia celular digital;  automóveis importados; acesso gratuito à Internet, mas ainda tem gente que morre de malária e está  cheia de criança barriguda de tanto verme. É meio  complicado explicar.
      Se já encontramos o chefe?
      Olha Rei, tá meio complicado. Aqui tem muito cacique  para pouco índio.
      Logo que chegamos a Porto Seguro tinha um cacique  lá que dizia que fazia chover, que mandava prender e  soltar quem ele quisesse. É um cacique bravo  mesmo...   Mais para o Sul encontramos outra tribo, uma  aldeia maravilhosa e muito festiva, com lindas nativas  quase nuas.
      Seguindo em direção ao Sul, saímos do litoral  e adentramo-nos ao planalto.   Lá encontramos uma  tribo muito grande. A dos índios Sampa.  Conhecemos seu cacique, que tinha apito, mas que não apitava  nada, coitado.  Dizem até que ele apanha da mulher. O  senhor está rindo, Majestade?  Juro que é verdadeiro o meu relato. Como vossa Majestade pode  perceber é uma terra fácil de colonizar, pois  os nativos não falam a mesma língua.
      Sim, são pacíficos sim. É só verem um  côco no chão para eles começarem a chutá-lo e esquecerem-se da vida. Sabem, sabem ler, mas  não todos. A maioria lê muito mal e acredita em  tudo que é escrito. Vai ser moleza, fica frio.
      Parece que há um "Cacicão Geral", mas ele quase  não é visto. O homem viaja muito.  Dizem que se a  intenção for evitar encontrá-lo, é só ficar sentado no trono dele.
      Engraçado mesmo é que a "indiaiada" trabalha a  troco de banana. É banana! Todo mês eles  recebem no mínimo 151 bananas.
      Não é piada, Majestade! É sério!  Só vindo aqui prá ver.
      Olha, preciso desligar.
      O rapaz que me emprestou o telefone celular precisa fazer  uma ligação.  Ele é comerciante. Disse que precisa avisar ao povo que chegou um novo carregamento de farinha.  Engraçado...  eles ficam tão contentes em  trabalhar...  A cada mercadoria que chega, eles sobem o  morro e soltam rojões.  É uma terra muito rica,  Majestade.
      Acho que desta vez acertamos em cheio.  Isso aqui ainda vai ser o país do futuro...


Autor: Paulo D'Angelo, publicitário, reescreveu a  Carta de Caminha e ganhou o concurso "Crônica do  Ouvinte" promovido pela Rádio Bandeirantes.

Nenhum comentário:

Postar um comentário