terça-feira, 12 de novembro de 2013

ARCADISMO- parte I



O Arcadismo
Objetivo: esta lição mostrará detalhe sobre o estilo literário: arcadismo. Como surgiu, quais foram os seus principais autores e escritores. Que ideologias foram as bases para esse movimento e como ele repercutiu na sociedade da época. Como foi a sua atuação em Portugal.

ARCADISMO
O Arcadismo, ou Setecentismo (anos 1700) ou Neoclassicismo é o período que  caracteriza principalmente a Segunda metade do século XVIII,porque o espírito reformista envolve este século numa valorização antropocêntrica, de um saber racional que reflete o desenvolvimento tecnológico, industrial, social e científico. Vive-se, agora, o Século das Luzes, o iluminismo burguês que prepara o caminho para a Revolução Francesa.
No início do século XVIII ocorre a decadência do pensamento barroco, para a qual colaboraram vários fatores: o exagero da expressão barroca havia cansado o público, e a chamada arte cortesã, que se desenvolvera desde a Renascença, atinge em meados do século um estágio estacionário e mesmo decadente, perdendo terreno para o subjetivismo burguês; o problema da ascensão burguesa supera a questão religiosa; surgem as primeiras arcádias, que procuram a pureza e a simplicidade das formas clássicas; no combate ao poder monárquico, os burgueses cultuam o "bom selvagem", em oposição ao homem corrompido pela sociedade do Ancien Régime ( o velho regime monárquico). Como se observa, a burguesia atinge a  hegemonia econômica e passa a lutar pelo poder político, então em mãos da monarquia. Isso se reflete claramente no campo social e artístico: a antiga arte cerimonial cortesã dá lugar ao gosto burguês.
O Arcadismo tem espírito nitidamente reformista, pretendendo reformular o ensino, os hábitos, as atitudes sociais, uma vez que é a manifestação artística de um novo tempo e de uma nova ideologia. No século XVIII a influência sobre Portugal vem da França devido a emancipação política da burguesia. Essa mesma burguesia é responsável pelo desenvolvimento do comércio e da indústria e já assistia a algumas vitórias na Inglaterra e Estados Unidos. Na França, a partir de 1750, os filósofos atacam o poder real e clerical e denunciam a corrupção dos costumes com grande violência.
Em Portugal, o Arcadismo estende-se desde 1756, com a fundação da Arcádia Lusitana, até 1825, com a publicação do poema "Camões", de Almeida Garret, considerado o marco inicial do Romantismo português.
No Brasil, considera-se como data inicial do Arcadismo o ano 1768, em que ocorrem dois fatos marcantes: a fundação da Arcádia Ultramarina, em Vila Rica, e a publicação de Obras, de Cláudio Manuel da Costa. A Escola Setecentista desenvolve-se até 1808, com a chegada da Família Real ao Rio de Janeiro, a qual, com suas medidas político-administrativas, permite a introdução do pensamento pré-romântico no Brasil. 

- CONTEXTO HISTÓRICO-CULTURAL 


No século XVIII, o fortalecimento político da burguesia e o aparecimento dos filósofos iluministas formam um novo quadro sociopolítico-cultural, que necessita de outras fórmulas de expressão.
Combate-se a mentalidade religiosa criada pela Contra-Reforma, nega-se a educação jesuítica praticada nas escolas, valoriza-se o estudo científico e as atividades humanas, num verdadeiro retorno à cultura renascentista. A literatura tem por objetivo restaurar o equilíbrio por meio da razão.
Em meados do século XVIII surge na Inglaterra e na França uma burguesia que passa a dominar economicamente o Estado, através de um vasto comércio ultramarino e da multiplicação de estabelecimentos bancários, assenhoreando-se mesmo de uma parte da agricultura. Em toda a Europa tais circunstâncias são semelhantes, e as influências do pensamento burguês se alastram. Nesse momento, geram-se duas manifestações distintas, mas que se completam.
O momento poético nasce de um encontro, com a natureza e os afetos comuns do homem, refletidos através da tradição clássica e de formas bem definidas, julgadas dignas de imitação  (Arcadismo); e o momento poético ideológico, que se impõe no meio do século, e traduz a crítica da burguesia culta aos abusos da nobreza e do clero.
Em 1748, Montesquieu publica O espírito das leis, obra na qual propõe a divisão do governo em três poderes ( Executivo, legislativo e Judiciário). Voltaire, como Montesquieu, relacionado com a alta burguesia, defende uma monarquia esclarecida. Em 1851, dirigido por Diderot e D'Alembert, aparece o Discours préliminaires de l'encyclopédie, cultuando a razão, o progresso e as ciências. Importante papel desempenhou Jean-Jacques Rousseau (O contrato social; Emílio), defensor de uma governo burguês e do ideal de "bom selvagem"o homem nasce bom, a sociedade é que o corrompe"; portanto, o homem deveria voltar-se para o refúgio da natureza pura). É dentro desse quadro que se desenvolve o Iluminismo europeu, transformando o século XVIII no Século das Luzes, que resulta no despotismo esclarecido, governo forte dando segurança ao capitalismo mercantil da burguesia e preparando terreno para a Revolução Francesa.
A influência neoclássica penetrou em todos os setores da vida artística européia, no século XVIII.
Na Itália essa influência assumiu feição particular. Conhecida como Arcadismo, inspirava-se na lendária região da Grécia antiga. Segundo a lenda, a Arcádia era dominada pelo deus Pan e habitada por pastores que, vivendo de modo simples, e espontâneo, se divertiam cantando, fazendo disputas poéticas e celebrando o amor e o prazer. 
Os italianos, procurando imitar a lenda grega, criaram a Arcádia em 1690 - uma academia literária que reunia os escritores com a finalidade de combater o Barroso e difundir os ideais neoclássicos. Para serem coerentes com certos princípios, como simplicidade e igualdade, os cultos literários árcades usavam roupas e pseudônimos de pastores gregos e reuniam-se em parques e jardins para gozar a vida natural.
No Brasil e em Portugal, a experiência neoclássica na literatura se deu em torno dos modelos do Arcadismo italiano, com a fundação de academias literárias, simulação pastoral, ambiente campestre, etc.
Esses ideais de vida simples e natural vêm ao encontro dos anseios de um novo público consumidor em formação, a burguesia, que historicamente lutava pelo poder e denunciava a vida luxuosa da nobreza nas cortes.

- EXPRESSÃO ARTÍSTICA DA BURGUESIA


Foi  nesse contexto de fermentação filosófica e lutas políticas que surgiu o Arcadismo, voltado para um novo público consumidor, formado pela burguesia e pela classe média. Como expressão artística dessas camadas sociais, o Arcadismo identifica-se com as idéias da Ilustração e veicula-as sob a forma de valores que se opõem ao tipo de vida levado pelas cortes aristocráticas e à arte que consumiam, o Barroco.
Daí a idealização da vida natural, em oposição à vida urbana; a humildade, em oposição aos gastos exorbitantes da nobreza; o racionalismo, em  oposição à fé; a linguagem simples e direta, em oposição à linguagem rebuscada do Barroco. Esses valores artísticos e culturais assumiram, no contexto da sociedade européia do século XVIII, um significado de clara contestação política, já que flagravam os privilégios da nobreza e do clero e propunham uma sociedade mais justa, racional e livre.
O Arcadismo pode ser visto, sob o ponto de vista ideológico, como um arte revolucionária. Contudo, do ponto de vista estético, é uma arte conservadora, pois ainda se liga à tradição clássica, tanto tempo cultivada pelas cortes aristocráticas.

- CARACTERÍSTICAS DO MOVIMENTO LITERÁRIO

A linguagem árcade é a expressão das idéias e dos sentimentos do artista do século XVIII. Seus temas e sua construção procuram adequar-se à nova realidade social vivida pela classe que a produzia e a consumia: a burguesia.
Outras características da linguagem árcade que merecem destaque:
Características
- Arte ligada ao Iluminismo. Oposição ao absolutismo despótico e ao poder (barroco) da Igreja.
-  Afirmação orgulhosa da racionalidade. Razão = Verdade = Simplicidade e clareza.
Culto da simplicidade. Como se atinge a mesma? Através da imitação (não no sentido de cópia, mas no de seguir modelos já estabelecidos).
- Imitação dos clássicos gregos. Em especial, Virgílio e Teócrito, clássicos pastoris.
- Imitação da natureza campestre, isto é, da ordem e do equilíbrio que essa natureza apresenta, o que dá a mesma um caráter de paraíso perdido. Dois elementos decorrem da aproximação do árcade da natureza campestre: 
- Bucolismo: adequação do homem à harmonia e serenidade da natureza.
- Pastoralismo: celebração da vida pastoril, vista como um eterno idílio entre pastores e pastoras.
- Ausência de subjetividade. O autor não expressa o seu próprio eu, adota uma forma pastoril ( era comum os escritores usarem pseudônimos em seus poemas,sonetos e obras, como exemplo: Cláudio Manuel da Costa é Glauceste Satúrnio, Tomás Antônio Gonzaga é Dirceu, Basílio da Gama é Termindo Sipílio,) 
- Amor galante. O amor é entendido como um conjunto de fórmulas convencionais.
fugere urbem ( fuga da cidade): influenciados pelo poeta latino Horácio, os árcades defendiam o bucolismo  como ideal de vida, isto é, uma vida simples e natural, junto ao campo, distante dos centros urbanos. Tal princípio era reforçado pelo pensamento do filósofo francês Jean Jacques Rousseau, segundo o qual a civilização corrompe os costumes do homem, que nasce naturalmente bom.

aurea mediocritas ( vida medíocre materialmente mais rica em realizações espirituais): A idealização de uma vida pobre e feliz no campo, em oposição à vida luxuosa e triste na cidade. Nestes versos de Tomás Antônio Gonzaga, por exemplo, são exaltados o trabalho manual e o sentimento, em oposição ao artificialismo e às facilidades da vida urbana:
Se não tivermos lãs e peles finas,
Podem mui bem cobrir as carnes nossas
As peles dos cordeiros mal curtidas,
E os panos feitos com as lãs mais grossas.
Mas ao menos será o teu vestido
Por mãos de amor, por minhas mãos cosido.
Idéias iluministas: como expressão artística da burguesia, o Arcadismo direciona certos ideais políticos e ideológicos dessa classe, no caso, ideais do Iluminismo. Os iluministas foram pensadores que defenderam o uso da razão, em contraposição à fé cristã, e combateram o Absolutismo.
Convencionalismo amoroso: na poesia árcade, as situações são artificiais; não é o próprio poeta quem fala de si e de seus reais sentimentos. No plano amoroso, por exemplo, quase sempre é um pastor que confessa o seu amor por uma pastora e a convida para aproveitar a vida junto à natureza. Porém, ao se lerem vários poemas, de poetas árcades diferentes, tem-se a impressão de que se trata sempre de um  mesmo homem, de uma mesma mulher e de um mesmo tipo de amor. Não há variações emocionais. Isso ocorre devido ao convencionalismo amoroso, que impede a livre expressão dos sentimentos. O que mais importava ao poeta árcade era seguir a convenção, fazer poemas de amor como faziam os poetas clássicos, e não expressar os sentimentos. A mulher é vista como um ser superior, inalcançável e imaterial.
Carpe diem: o desejo de aproveitar o dia e a vida enquanto é possível, esta idéia  é retomada pelos árcades e faz parte do convite amoroso.

- O ARCADISMO EM PORTUGAL

Para os portugueses, o século XVIII iniciou-se com um processo de modernização, através dos planos econômico, político, administrativo, educacional e cultural. A produção literária foi ampla e variada, incentivada principalmente pelas academias literárias árcades. A principal expressão literária desse período, Manuel Maria du Bocage, foi um dos maiores poetas portugueses de todos os tempos,  Nas primeiras décadas desse século, chegaram a Portugal as idéias iluministas, que entusiasmaram intelectuais, artistas e até mesmo o rei D. João V e seu sucessor D.José I, que desejavam modernizar o país.
Esse projeto deveria, ainda, satisfazer os interesses da burguesia mercantil e colonial, equiparando Portugal novamente às grandes nações européias. Com amplos poderes, e, na condição de ministro, o Marquês, foi indicado a liderar essas idéias.
Com formação estrangeira, o Pe. Luis Antônio Verney, mudou significativamente o cenário científico e artístico português, usando projeto de reforma pedagógica. Suas idéias expostas na obra: Verdadeiro método de estudar (1764), em que o escritor, atacava a orientação que os jesuítas davam ao país. Criticava a arte barroca e seus adeptos, como o Pe. Vieira.Nem mesmo Camões escapou das críticas, que viam nas antíteses camonianas, traços da estética barroca.
Essas críticas originaram um amplo debate sobre a necessidade de renovar a cultura portuguesa. Como decorrência desse período de agitação cultural, foi fundada a Arcádia Lusitana, em 1756, considerada o marco introdutório do Arcadismo em Portugal.

As academias literárias

As academias literárias eram agremiações que tinham por objetivo promover o debate permanente sobre a criação artística, avaliar criticamente a produção de seus filiados e facilitar a publicação de suas obras.
Portugal contou com duas importantes academias árcades: a Arcádia Lusitana, que efetivamente deu início ao movimento árcade em Portugal, e a Nova Arcádia (1790), que contou com o maior poeta português do século XVIII: Manuel Maria Barbosa du Bocage.
O gênero literário predominante durante o Arcadismo português foi a poesia. 
Durante o século XVIII, dos escritores portugueses que mais se destacaram , um merece atenção especial:

MANUEL MARIA BARBOSA DU BOCAGE: (Elmano Sadino)
O poeta português Manuel Maria Barbosa du Bocage, também conhecido com o pseudônimo árcade de Elmano Sadino ( Elmano é um anagrama de Manuel e Sadino é relativo ao rio Sado, que corta a cidade de Setúbal, onde nasceu em 15 de setembro de 1765). Além das inúmeras experiências amorosas, ele viveu aventuras nas colônias portuguesas do Oriente como na Índia (Goa) e na China (Macau), teve quase o mesmo caminho que de Camões. Como ele, Bocage também se incorporou em companhias militares, lutou na guerra, naufragou, amou muitas mulheres e sofreu com elas, foi preso e morreu na miséria.
Foi na lírica, em especial nos sonetos, que Bocage atingiu o ponto alto de sua obra, embora também tenha se destacado como poeta satírico e erótico.
Bocage é considerado o melhor escritor português do século XVIII e, ao lado de Camões e de Antero de Quental, um dos três maiores sonetistas de toda a literatura portuguesa. Isso ocorreu porque sua obra traduz o momento transitório que viveu (1765-1805), ou seja, um período marcado por mudanças profundas, como a Revolução Francesa (1789) e o florescimento do Romantismo. Assim, a obra de Bocage, em sua totalidade, não é árcade nem romântica: é uma obra de transição, que apresenta simultaneamente aspectos dos dois movimentos literários.

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