A VIDA SEM CELULAR
O inevitável aconteceu: perdi meu
celular. Estava no bolso da calça. Voltei do Rio de Janeiro, peguei um táxi no
aeroporto. Deve ter caído no banco e não percebi. Tentei ligar para o meu
próprio número. Deu caixa postal. Provavelmente eu o desliguei no embarque e
esqueci de ativá-lo novamente. Meu quarto parece uma trincheira de guerra de
tanto procurá-lo.
Agora me rendo: sou um homem sem
celular. O primeiro sentimento é de pânico. Como vou falar com meus amigos?
Como vão me encontrar? Estou desconectado do mundo. Nunca botei minha agenda em
um programa de computador, para simplesmente recarregá-la em um novo aparelho.
Será árduo garimpar os números da família, amigos, contatos profissionais. E se
alguém me ligar com um assunto importante? A insegurança é total. Reflito.
Podem me achar pelo telefone fixo. Meus amigos me encontrarão, pois são meus
amigos. Eu os buscarei, é óbvio. Então por que tanto terror?
Há alguns anos - nem tantos assim –
ninguém tinha celular. A implantação demorou por aqui, em relação a outros
países. E a vida seguia. Se alguém precisasse falar comigo, deixava recado.
Depois eu chamava de volta. Se estivesse aguardando um trabalho, por exemplo,
eu ficava esperto. Ligava perguntando se havia novidades.
Muitas
coisas demoravam para acontecer. Mas as pessoas contavam com essa demora. Não
era realmente ruim. Saía tranquilo, sem o risco de que me encontrassem a
qualquer momento, por qualquer bobagem.
A maior parte das pessoas vê urgência
onde absolutamente não há. Ligam afobadas para fazer uma pergunta qualquer. Se
não chamo de volta, até se ofendem.
— Eu estava no cinema, depois fui
jantar, bater papo.
— É... Mas podia ter ligado!
Como dizer que podia, mas não queria?
Vejo motoristas de táxi tentando se
desvencilhar de um telefonema.
— Agora não posso falar, estou
dirigindo.
— Só mais uma coisinha...
Fico apavorado no banco enquanto ele
faz curvas e curvas, uma única mão no volante. Muita gente não consegue
desligar mesmo quando se explica ser impossível falar. Dá um nervoso!
A maioria dos chefes sente-se no
direito de ligar para o subordinado a qualquer hora. Noites, fins de semana,
tudo submergiu numa contínua atividade profissional. No relacionamento pessoal
ocorre o mesmo.
— Onde você está? Estou ouvindo uma
farra aí atrás.
— Vendo televisão! É um comercial de
cerveja!
Um amigo se recusa a ter celular.
— Fico mais livre.
Às vezes um colega de trabalho
reclama:
— Precisava falar com você, mas não te
achei.
— Não era para achar mesmo.
Há quem desfrute o melhor. Conheço uma
representante de vendas que trabalha na praia durante o verão. Enquanto torra
ao sol, compra, vende, negocia. Mas, às vezes, quando está para fechar o
negócio mais importante do mês, o aparelho fica fora de área. Ela quase
enlouquece!
Pois é. O celular costuma ficar fora
de área nos momentos mais terríveis. Parece de propósito! Como em um recente
acidente automobilístico que me aconteceu. Eu estava bem, mas precisava falar
com a seguradora. O carro em uma rua movimentada. E o celular mudo! Quase
pirei! E quando descarrega no melhor de um papo, ou, pior, no meio da briga,
dando a impressão de que desliguei na cara?
Na minha infância, não tinha nem
telefone em casa. Agora não suporto a ideia de passar um dia desconectado. É
incrível como o mundo moderno cria necessidades. Viver conectado virou vício.
Talvez o dia a dia fosse mais calmo sem celular. Mas vou correndo comprar um
novo!
(CARRASCO, Walcyr. A
vida sem celular. Veja São Paulo, São Paulo, n.2107)
"Afasta o que te faz mal e reaproxima o que te faz bem"
ResponderExcluirBruna Dias.
Escolhemos a mensagem de Bruna,porque foi a mais bem elaborada pelos meus olhos.Fez sentido!
ResponderExcluirRafaela Carvalho.
Entrei em acordo com o comentário de Rafaela,ao dizer que frase de Bruna,foi a mais bem elaborada entre as nossas três.Entramos num consenso e escolhemos a dela.De acordo com a ocasião.
ResponderExcluirLarissa Dos Reis
Gostei muito do seu blog. Sou professora e vou aproveitar todas as suas sugestões de textos, atividades, também visitei a página do facebook e curti. Um forte abraço!
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